segunda-feira, 2 de março de 2015

Rótulos

O que estraga um namoro é namorar. Essa mania de namorado – quase que automática – em ficar escoltando a vida da parceira estraga tudo. No começo até soa bonitinho, fofinho. Mas sufoca. Outro erro Crasso é elaborar uma rotina na qual além da sua própria rotina você vive integralmente a rotina do outro. Sabe a que horas a pessoa acorda, quanto tempo leva no transito, com quem almoça, se está sentindo calor à tarde, com que roupa vai à academia. E de quebra, se sente no direito de opinar no dia a dia desse seu mais novo fantoche.
Um grande aliado nessa arte da escolta é o smartphone. As regras ouro são: nunca permitir que a bateria acabe e que o 3G caia. Ambas quase inevitáveis. Mas, uma boa namorada anda com um carregador na bolsa e rouba wi-fi de cada estabelecimento que frequenta. Assim, é possível que seu “amor” acompanhe de perto o seu dia. Observe sua última visualização no whatsApp (porque obviamente uma namorada que se preze não oculta visualização) e receba fotos instantâneas de cada passo seu.
E aí, esse típico casal combina já na quarta-feira feira de manhã onde irão jantar. E no jantar, programam todo o final de semana. Milimétricamente. Eles conhecem o guarda roupa um do outro, sabem o que guardam no porta-luvas de seus respectivos carros, e em qual semáforo ela doou a moeda de dez centavos que estava no porta-objetos desde segunda-feira. E então, desse modo patético se encaminha um namoro comum.
Acontece, que o amor, a paixão e a juventude vão muito além dessa ladainha toda. A grande sacada da felicidade é deixar rolar, o famoso “Vâm Vivê, depois a gente vê”. Receber uma ligação do cara que você ama, no meio de uma madrugada comum, dizendo que tá com medo de dormir sozinho. Sair pra tomar um sorvete no sábado à tarde e voltar pra casa só na segunda-feira cedo. Não ter o famoso “seu lado da cama”. Ir com suas amigas pra um show e esquecer-se de chamar seu amor. Esquecer datas especiais, horário do cinema, jantares com as famílias. Atrasar-se. Não trair, nem a ele e nem a você mesma, porque essa atipia lhe faz gostar tão intensamente que naturalmente a honestidade anda junto.

O ápice do amor acontece quando você vive seu mundo, ele o dele e juntos vocês vivem um terceiro plano. Uma bolha, só de vocês. Sem regra ou pudor algum, sem poluição do mundo exterior. Sem rotina. Sem rótulo. Sem cobrança. Sem horário. E com uma expectativa tremenda, que se faz e se desfaz constantemente. Servindo de combustível pra essa loucura toda e garantindo um “boom” de emoções que te faz sentir-se viva. E quando alguém pergunta qual a relação entre vocês, nenhum dos dois sente vontade de responder que namoram.  Porque, a verdade é que a relação de vocês é só a melhor relação do mundo.

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