Ela o ouviu contando aos amigos
qual nome ele sonhava dar a um filho futuro. E foi, para ela, como uma dose
instantânea de anestésico. Desde criança ela sonhava com aquele mesmo nome para
um futuro filho. Perdeu-se no tempo imaginando uma vida toda ao seu lado.
Aquelas tantas pessoas vazias que
tanto a irritam, sumiriam aos poucos, se desfazendo como fumaça. E os dois viveriam
um universo só deles, colorido com suas cores prediletas. Ele seria psiquiatra
e nas horas vagas, publicitário. Ela seria cirurgiã e jornalista sempre que
sobrasse tempo. Teriam um Fusca 72 vermelho e um carro de bacana pra visitar os
pais nos finais de semana.
Beberiam cerveja e ririam da vida
toda a noite vendo novela. Usariam moletons iguais para ir ao mercado.
Gastariam ao menos metade de seu tempo e dinheiro com música. Durante o dia ensinariam
seu filho a andar de skate. E durante a madrugada sairiam - em silêncio para
não acordar o moleque - pra dar um role de skate à luz da lua. Permaneceriam
relutantes a se enquadrar em padrões sociais pré-estabelecidos.
Discutiriam política e
criticariam o PT. Esquecer-se-iam de almoçar, e passariam tardes e tardes
esfomeados. Viajariam para Tunísia, Egito, Grécia, Amsterdam , Rússia, Ucrânia
e jamais para a Disney. Alfabetizariam seu filho em casa. Apresentariam a ele o
Rock and Roll durante a sua primeira semana de vida. E eternamente competiriam
pra convencer a criança a torcer para o Grêmio ou para o Corinthians.
E então, ele a acordou dessa
viaje toda: “Amor, dê-me as chaves. Vou buscar o Raul no colégio”. Dez anos
haviam se passado.
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